2005/09/18

As Tentativas Espanholas

Já aqui referi que tentei apoios espanhóis para o "África", a propósito do incidente com o Eugénio Inocêncio, o fato os sapatos e o resto.

A certa altura foi visível que Espanha tentava substituir, nomeadamente em Angola, Portugal. Afinal também não era difícil. Felipe Gonzalez procurava, com inteligência, parceiros que lhe abrissem possibilidades em África. Durante a visita de Pedro Pires a Madrid, em Fevereiro de 85, essa intenção ficou clara.

Em Portugal tentava-se, por todas as formas, eliminar o "África", começando pelas distribuidoras, passando pelos postos de venda que o escondiam por forma a não ser visto. As autoridades com alguma obrigação de apoiar o projecto, assobiavam para o lado. O jornal era bom porque inspirava uma corrente de informação a que bastava acrescentar ou tirar pequenos pormenores. Havia mesmo gente que plagiava textos nossos, virgula por vírgula, só o nome do autor mudava...

Os apoios africanos dependiam muito das próprias concepções de informação. Apoio para eles significava a possibilidade de manipular e eu não abria mão. Lembro-me, inclusivé, de alguns episódios curiosos: gente notável da redacção que vinha quase solicitar-me uma intervenção nos textos, receosos de que alguma coisa pudesse prejudicar a via negocial. A todos respondi sempre da mesma forma: ao convidá-los tinham a minha confiança, tudo quanto escrevessem era da responsabilidade deles.

Todavia, o jornal tinha de se pagar; o grupo de profissionais que dependia exclusivamente das receitas era importante e eu tratava de me mexer.

Falou-se na possibilidade de um grupo de empresários madrilenos estar interessado na possibilidade de nos apoiar e aí fui eu. Jantar com uma personalidade amiga de Felipe Gonzalez, hotel marcado numa das transversais da Gran Via. Oito horas da noite telefonei. "Jantar? Ainda é cedo. Eu depois passo aí" - disse a figura.

Onze horas da noite, apareceu o homem, um senhor. Conduziu-me até um restaurante fora do centro, com uma vista esplendorosa sobre a cidade e, enquanto esperávamos pelo jantar foi bebendo Gin tónico: mais de metade do copo com gin e um pouquito de água tónica.

Jantámos. Falámos e ele demonstrou o mais profundo espanto pela atitude das autoridades portuguesas, recusando o apoio a um jornal que obviamente era um instrumento poderoso.

Tinha, claramente, pensado na possibilidade de mobilizar apoios para o "África", mas chegou à conclusão que tal não fazia sentido. Deu-me o exemplo do que eles, espanhóis, faziam com a América Latina.

No final do jantar, para aí umas três da manhã, o meu anfitrião conduziu-me a alta velocidade até ao meu hotel. Na despedida ficou o lamento por uma recusa que era uma atitude de inteligência - dizia ele. Um apoio espanhol a um jornal português dedicado a África, naquela altura, abria a possibilidade de diversos conflitos.

Voltei a Lisboa no dia seguinte sem sequer o esboço de uma boa notícia para a minha gente. Todos o perceberam sem a necessidade de grandes conversas.

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